domingo, 29 de abril de 2012

O recrutamento de jovens nos morros e favelas do país:

Fonte: http://www.abctrust.org.uk/useful_docs/Dowdney-ChildCom02_PT.pdf


               Como o Rio de Janeiro não está oficialmente em estado de guerra, as crianças e adolescentes que trabalham, armadas, para as facções da droga na cidade são classificadas como delinqüentes juvenis, criminosos ou membros de quadrilhas. No entanto, o papel dos que tomam parte nas disputas territoriais das facções da droga talvez tenha mais em comum com a vida das “crianças soldados” em situações de guerra do que com a vida dos membros de quadrilhas, segundo definições tradicionais, encontrados em outras áreas urbanas do mundo.

               As favelas não são os únicos lugares onde se vendem drogas e, apesar de serem bases logísticas essenciais e defensáveis, elas representam a manifestação mais pobre e menos sofisticada do tráfico. Os empregados das facções são geralmente da comunidade, sendo aceitos como uma força sócio-política semi-legítima, tanto por medo como pela falta de alguma alternativa séria. Não é a completa ausência do poder público que habilita as facções a dominarem as comunidades faveladas, mas antes o fracasso do poder público em estabelecer um contrato social com os moradores. Esse contrato socialé  sustentado muito efetivamente pelas facções.

               Apesar das crianças e adolescentes terem estado no passado envolvidos com o tráfico,  hoje nas favelas o envolvimento é maior do que antes. As crianças que eram empregadas por revendedores de droga, antes do surgimento das facções em geral, não eram armadas e recebiam “presentes” em vez de dinheiro ou de um salário fixo em pagamento de seus serviços. O aumento do número de crianças trabalhando no tráfico começou no início dos anos 80 quando as facções começaram a se estabelecer  nas favelas do Rio e se intensificou principalmente a partir de 1993, quando as disputas entre facções se tornaram muito mais intensas. A partir desse período, crianças e adolescentes começaram a substituir traficantes mais velhos no trabalho, já que muitos estavam presos ou mortos em confrontos com rivais ou com a polícia.

               As crianças estão expostas ao tráfico desde muito cedo na favela, e aquelas que se interessam pelo tráfico começam a “andar”  com traficantes, passando ao trabalho em tempo integral entre 10 e 15 anos. Entram voluntariamente, não sendo forçadas ou coagidas pelas facções para começar a trabalhar.  A “escolha” do trabalho no tráfico pode ser definida como a “melhor alternativa entre opções limitadas”. As opções limitadas são mostradas de modo  cru por um conjunto de fatores preexistentes, comuns a todas as crianças das favelas do Rio: a dominação pelas facções, a pobreza, a falta de acesso ao mercado formal de trabalho e o tráfico visto como forma aceitável de emprego.  A “escolha”  é também afetada pelos atrativos do tráfico e por outras influências, vistas como comuns a todos os envolvidos, como o envolvimento de parentes e de outros grupos de referência.

               Os empregos das facções nas favelas do Rio abertos a crianças e adolescentes são principalmente: olheiro/fogueteiro; vapor, gerente de boca, soldado e fiel. No nível inferior de emprego, a divisão do trabalho não é sempre específica e responsabilidades cruzadas resultam na participação ativa da maioria dos menores na segurança e na defesa armada da favela contra facções rivais e contra batidas policiais.

               Os homicídios por armas de fogo são a maior causa externa de morte de crianças e adolescentes no Rio. Os níveis dessas mortes de jovens menores de 18 anos cresceram muito desde o fim dos anos 70. O grupo etário entre 15 e 17 anos é o mais afetado pelas mortes por tiros, em particular nas regiões da cidade onde são mais comuns os conflitos entre facções, refletindo que o número de menores que trabalham na segurança armada dos territórios das facções é maior nessa faixa etária.

               Existem fortes semelhanças entre as crianças empregadas pelas facções da droga no Rio de Janeiro e as “crianças soldados” , no que diz respeito ao aspecto funcional e definido. Mas as crianças das   facções da droga  são basicamente empregados armados de grupos economicamente definidos dentro da categoria da Violência Armada Organizada. Não são ”soldados”  lutando num “conflito armado" ou numa “guerra”  tradicionalmente definidos. 




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